Critério de Aceitação de Balanças: Por Que a Portaria INMETRO 157/2022 Não é Suficiente?
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A calibração de instrumentos de medição é fundamental para garantir a qualidade e confiabilidade dos resultados em qualquer processo. No entanto, a calibração por si só não é suficiente para assegurar a confiabilidade do instrumento. É crucial analisar criticamente os resultados da calibração em contraste com um critério de aceitação bem definido.
Definir o critério de aceitação para balanças baseando-se apenas na Portaria INMETRO 157/2022 pode ser insuficiente, pois a portaria não leva em consideração aspectos importantes que devem ser observados quando se cria um critério de aceitação para uma balança. Este artigo abordará dicas e boas práticas sobre como criar um critério de aceitação eficaz, que englobe não apenas o erro máximo admissível da balança, mas também a incerteza de medição, garantindo a adequação do instrumento à tolerância do processo.
Imagine que um médico recebe um resultado de laboratório indicando 1200 mg/L para um determinado parâmetro. Sem um valor de referência adequado, o médico não pode determinar se o paciente está saudável ou não. Seria estranho o médico recorrer à portaria de fabricação do instrumento de análise para obter esse parâmetro, não é mesmo? Afinal, cada paciente é único e possui suas próprias condições de saúde.
Da mesma forma, ao definirmos o critério de aceitação para uma balança, não podemos nos basear apenas na Portaria INMETRO 157/2022. A portaria oferece diretrizes gerais no âmbito de fabricação de balanças, mas não considera as particularidades de cada processo. Uma balança utilizada em uma indústria farmacêutica, por exemplo, opera sob requisitos de precisão muito mais rigorosos do que uma balança utilizada em um supermercado.
Portanto, a chave para garantir a adequação de um instrumento de medição, como uma balança, reside na análise minuciosa do processo em que ele será utilizado. É fundamental determinar as tolerâncias aceitáveis para o seu processo específico e verificar se o instrumento atende a esses requisitos. A Portaria INMETRO 157/2022 pode servir como ponto de partida, mas a análise do seu processo é o que realmente definirá o critério de aceitação adequado.
Cálculo do Erro Máximo Admissível (EMA) Segundo a Portaria 157/2022
A portaria 157/2022 pode oferecer um bom ponto de partida para a definição de critérios de aceitação, desde que sua aplicação seja compreendida corretamente.
Um dos principais conceitos abordados pela portaria é o Erro Máximo Admissível (EMA), frequentemente utilizado na criação de critérios de aceitação para balanças. No entanto, é importante ressaltar que o EMA pode não ser suficiente por si só. Antes de prosseguirmos, vamos revisar alguns fundamentos básicos da metrologia:
· Capacidade/Valor Máximo: Refere-se à capacidade máxima de pesagem de uma balança.
· Divisão (d): Representa a menor variação de massa que a balança consegue detectar.
· Divisão de Verificação (e): A divisão de verificação é similar à divisão, mas foi criada para lidar com as variações nas condições ambientais que afetam a leitura da balança. O fabricante define a divisão de verificação como o menor valor em que a balança apresenta maior confiabilidade e precisão, mesmo em condições adversas como variações de temperatura, umidade, gravidade, oscilações elétricas e interferências nos circuitos eletrônicos.
Ao compreendermos esses conceitos, podemos utilizar a portaria e outros recursos relevantes para estabelecer o EMA. Veja este exemplo:
Utilizando como exemplo uma balança Ohaus com as seguintes características:
· Valor Máximo: 3100g
· Divisão (d): 0,01g
· Divisão de Verificação (e): 0,1g
· Classe: II
Podemos determinar o Número de Divisões de Verificação, através da seguinte fórmula:
Com essas informações, podemos consultar a Tabela 5 da Portaria Inmetro 157/2022 para determinar o erro máximo permitido (EMA) da balança. Vamos por partes:
1. Número de Divisões de Verificação: 31.000 (calculado anteriormente)
2. Classe da Balança: II (informação encontrada na placa de identificação da balança)
Agora, localizamos na Tabela 5 a coluna correspondente à Classe II. Nessa coluna, encontraremos o EMA para diferentes faixas de pesagem, de acordo com o número de divisões de verificação da balança.
Vamos analisar a frase “Para as cargas m, expressas em valores de divisão de verificação e” que pode ser interpretado da seguinte maneira: “Para as cargas ou massas X que na tabela estão expressas em valores de divisão de verificação (e).”
Para determinar as faixas de massa correspondentes aos valores da tabela, multiplicamos o limite superior de cada faixa pelo valor da divisão de verificação (e) da balança. No nosso exemplo, a divisão de verificação é 0,1g.
Exemplo:
· Faixa: 0 ≤ m ≤ 5.000e
· Cálculo: 5.000 x 0,1g = 500g
· Interpretação: A faixa de massa correspondente é de 0g a 500g.
Aplicando o mesmo cálculo para as demais faixas, obtemos:
· 0 ≤ m ≤ 5.000e => 0g a 500g
· 5.000e < m ≤ 20.000e => 500g a 2.000g
· 20.000e < m ≤ 100.000e => 2.000g a 10.000g
Observação: As faixas de massa são expressas em gramas (g) porque a divisão de verificação da balança também está em gramas.
Com todas as informações reunidas, podemos determinar o erro máximo admissível (EMA) para a nossa balança.
Consultando a Tabela, na coluna da Classe II e nas faixas de massa correspondentes, encontramos os seguintes valores em termos da divisão de verificação (e):
· Faixa de 0 a 500g: EMA = 1,0e
· Faixa de 500 a 2.000g: EMA = 2,0e
· Faixa de 2.000g a 10.000g ou superior: EMA = 2,0e
Lembrando que a divisão de verificação (e) da nossa balança é 0,1g, multiplicamos os valores encontrados por "e" para obter os EMAs em gramas:
· Faixa de 0 a 500g: EMA = 1,0 x 0,1g = 0,1g
· Faixa de 500 a 2.000g: EMA = 2,0 x 0,1g = 0,2g
· Faixa de 2.000g a 10.000g ou superior: EMA = 2,0 x 0,1g = 0,2g
Observação: É fundamental utilizar a coluna de "Verificação" da Tabela 5, pois a coluna de "Aprovação de Modelo" é destinada aos fabricantes de balanças.
Portanto, o erro máximo admissível para a nossa balança é:
· Na faixa de 0 a 500g: ±0,1g
· Na faixa de 500 a 2.000g: ±0,2g
· Na faixa de 2.000 a 10.000g ou superior: ±0,2g
Observação: Os erros máximos admissíveis para inspeção em serviço (supervisão metrológica) são iguais ao dobro dos erros máximos admissíveis nas verificações.
Ficando assim:
· Na faixa de 0 a 500g: ±0,2g
· Na faixa de 500 a 2.000g: ±0,4g
· Na faixa de 2.000 a 10.000g ou superior: ±0,4g
Definir o critério de aceitação para balanças baseando-se apenas na Portaria INMETRO 157/2022 pode ser insuficiente, pois a portaria não leva em consideração a incerteza de medição. Essa incerteza, que só é determinada durante a calibração, é um fator crucial para avaliar a confiabilidade dos resultados de pesagem. Portanto, para garantir a precisão e adequação da balança ao seu processo específico, é essencial considerar a incerteza de medição quando for criar o critério de aceitação, indo além dos limites de erro estabelecidos pela portaria.
Tolerância do processo:
Ao estabelecer critérios de aceitação para um instrumento de medição, como uma balança, é crucial considerar a tolerância do processo em questão. Imagine um cenário em que seu processo exige uma variação máxima de 1g para um produto, o critério de aceitação para a balança que é utilizado como controle deste processo deve ser obrigatoriamente menor que 1g.
Mas qual seria esse valor ideal? Uma regra geral, frequentemente utilizada na metrologia, sugere que o critério de aceitação seja, no mínimo, 1/3 da tolerância do processo. No nosso exemplo, isso resultaria em um critério de aceitação de 0,3g.
No entanto, é importante ressaltar que essa é apenas uma diretriz. A definição do critério de aceitação ideal deve levar em consideração as particularidades do seu processo. Em alguns casos, pode ser necessário adotar um critério mais rigoroso, como 1/10 da tolerância (0,1g no nosso exemplo). Em outros, um critério de 1/5 (0,2g) pode ser suficiente.
O fundamental é que o critério de aceitação seja sempre menor que a tolerância do processo.
Conclusão
Embora a Portaria Inmetro 157/2022 possa ser um ponto de partida para a definição do critério de aceitação de balanças, é fundamental compreender que este não é seu objetivo principal. A portaria não leva em consideração a incerteza de medição associada à calibração, um fator crucial na análise crítica de um certificado de calibração e na decisão sobre a aprovação de um instrumento de medição. A ideia geral é que o erro da balança, somado à sua incerteza de medição, seja menor que o critério de aceitação. E ao estabelecer o critério de aceitação, é essencial considerar o contexto de uso da balança e os requisitos de tolerância do processo em que ela será utilizada. Se o critério de aceitação for baseado na tolerância do processo, você terá maior segurança de que o erro da balança, somado à sua incerteza de medição, não afetará os resultados ou a aplicação da balança.